Ficha Limpa não pune toda condenação por improbidade

Sexta-feira, Fevereiro 24, 2012

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Ficha Limpa não pune toda condenação ou rejeição de contas por improbidade

Notícias de Direito
Texto publicado quinta, dia 23 de fevereiro de 2012 

Ficha Limpa não pune toda condenação por improbidade

Por Eduardo Mahon 

Caso a legislação, qualquer que seja, fosse de fácil e automatizada interpretação, certamente não haveria necessidade de doutrina, professor e faculdade. Juiz seria item superado. Felizmente, a hermenêutica jurídica é uma delicada disciplina da ciência do direito da qual nos socorremos em difíceis situações. Um exemplo: todo o ato de improbidade administrativa é capaz de conduzir o cidadão condenado à inelegibilidade? A Lei 8.429/1992 rege o direito material e processual atinente à improbidade e deve ser estudada à luz da Lei da Ficha Limpa.

Pois bem. Na lei de improbidade, no que concerne às penas, há expressa hipótese de perdimento dos direitos políticos de oito a dez anos, de cinco a oito e, finalmente, de três a cinco anos, conforme a gravidade/lesividade do ato improbo. E o artigo 20 indica que o agente só perderá os direitos políticos com sentença transitada em julgado. Daí surgir outra dúvida: toda condenação por ato de improbidade deverá estar limitada àquelas balizas ou se passarão a conduzir inexoravelmente à inelegibilidade por oito anos?

A Lei da Ficha Limpa impõe sanção e, como qualquer outra que imputa limitação ao exercício de direito, deve ser interpretada de forma restritiva, o que importa um perfeito enquadramento nas hipóteses taxativamente dispostas. Particularmente à improbidade, a alterada LC 64/1990 disciplina três hipóteses: artigo 1º, “g”, “l” e, eventualmente, o inciso “o”.

Contas rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade, condenação à suspensão de direitos políticos por ato doloso de improbidade que importe lesão ao patrimônio público e enriquecimento ilícito e, finalmente, aos demitidos em decorrência de processo administrativo ou judicial. Em todos esses casos, será de oito anos a vedação legal ao certame eleitoral. Oito anos — não mais, não menos.

Parece preciosismo, mas devemos dizer que, na Lei 8.429/1992, há uma classificação dos atos de improbidade: 1) atos que importam em enriquecimento ilícito, 2) atos que causam prejuízo ao erário, 3) atos que atentam contra os princípios da administração pública. Estes últimos, além de importarem numa sanção menor (inelegibilidade de três a cinco anos), não estão abarcados no texto final da Lei Complementar 64/1990, modificada pela Lei Complementar 135/2010.

Noutras palavras, não estão jungidos à Lei da Ficha Limpa o agente público condenado por todas as sete hipóteses do artigo 11 da Lei 8.429/1992, incluindo a frustração da licitude de concurso público. Da mesma forma, escapam aqueles que tiverem as contas rejeitadas, mas não especificamente por irregularidades insanáveis que configurem improbidade. Erro da lei? Brecha jurídica? Talvez. Mas é assim. Nem toda condenação ou rejeição de contas por ato de improbidade gera inelegibilidade, portanto.

A LC 135/2010 dispensou o trânsito em julgado para a perda dos direitos políticos, bastando simples condenação a partir de órgão colegiado. Também uniformizou para o teto de oito anos todos os demais casos (improbidades que importam enriquecimento ilícito e improbidades que causam prejuízo ao erário), o que na lei ordinária poderiam variar para menos (cinco anos) ou para mais (dez anos). Os que hoje estão inelegíveis por dez anos têm direito de se tornar elegíveis dois anos mais cedo? E os que estão inelegíveis com decisão transitada em julgado por cinco anos por improbidade que causaram prejuízo ao erário, agora estão automaticamente inelegíveis por mais três anos? Interessante, não?!

O Direito é tão belo quanto a capacidade humana de interpretá-lo! Eis aí polêmicas que valem um olhar atento. O assunto promete tanto que, no artigo 26-C da própria LC 135/2010, há o dispositivo da suspensão cautelar da inelegibilidade. É por isso mesmo que, fossem tão perfeitas as legislações, não seriam necessários advogados e juízes.


Eduardo Mahon é advogado em Mato Grosso e Brasília, doutorando em Direito Penal e membro da Academia Mato-Grossense de Letras.

Extraído de Estudando o Direito

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